segunda-feira, 19 de março de 2012

"Restos" (pra não nos tornarmos restos)



Refletindo sobre a última postagem do blog, o poema “Resumo”, de Camila Canêdo, e sobre a concepção do álbum “Wish You Where Here”, do Pink Floyd (que, em breve, receberá um poema-homenagem, a pedido do amigo, leitor e radialista Paulo Rodrigues), relembro hoje um poema originalmente publicado no meu quinto livro “Eu e outras Províncias”, de 2008. O poema que posto hoje, “Restos”, foi elaborado após um reencontro com velhos amigos da adolescência e reflete sobre as questões do crescimento humano, as mudanças e estagnações com a maturidade e a luta contra a acomodação em nossas vidas; um poema para uma segunda-feira nublada, um poema que propõe que, mesmo nos dias cinzas, mesmo na falta de novas perspectivas, devemos continuar, seguir em frente, ser sempre algo mais, antes que nos tornemos apenas meras lembranças empoeiradas de nós mesmos. A foto, tirada por mim com a câmera do celular quando parte da vidraça de minha janela se estilhaçou no teto vizinho, é uma tentativa de releitura desses momentos em que nossas janelas originais se quebram e avisam que é necessário nos reconstruirmos. pra ser lido ouvindo "Dias vermelhos", de Uns e Outros.

Restos

O que restou de nós?
O que restou dos nós?
que naquele jardim de emoções novas
nos amarramos
em armar
amar
ramos
de árvores delinquentes
nascidas na inconseqüência da juventude
inquietude
subindo nos galhos da vida
como macacos darwinianos
evoluindo pra depois cair
mas as raízes que nos caracterizam
também nos aprisionam
Nossos domínios são apenas uma ilusão
arrogância oculta da nossa limitação
atitude
altitude
pulando o muro pra novamente cair
Pretensiosos demais
ansiosos demais
demais para o bem ou para o mal
Assombrando a cidade opaca
absorvendo seu tempo estático
nos deixamos tragar pela melancolia
e agora a distância marca nossos olhos
Lágrimas no café da manhã
(o mesmo café forte e esquecido de todas as manhãs)
a tarde de domingo pra lembrar
a noite de segunda-feira pra esquecer
Você quer matar as saudades
enquanto eu penso em morrer
Não quero outra volta
revolta
Não quero lembrar, não quero esquecer
Quero outra vida
(foi assim que começamos)
plantar uma árvore
ter um filho
escrever outro livro
quero coragem de mudar o que restou de nós.






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