domingo, 3 de junho de 2012

A 33.ª Composição do Fim

Nos últimos dias, tive o privilégio de assistir e ouvir os novos talentos musicais de nossa região sul fluminense no IV Festival Intermunicipal (FIM) de Rio das Flores/RJ. Inspirado nos nomes das canções (destacadas no texto que fiz, assim como a sigla do evento) apresentadas no Festival, criei a minha composição poética, conforme prometi ao artistamigo Giovanni Nogueira. Não se encaixa como homenagem, porém é uma busca poética em dar destaque às 32 novas composições que tanto enriqueceram o evento musical ao qual tive a oportunidade preciosa de assistir:


Ensaio sobre a crença, a amizade, 
a fome e a humanidade

Fica sempre entreaberto
Aquele sentimento incerto
De que Deus não te deixará;
Cristo sempre contigo,
Mas outros amigos além de mim
Não há por aqui...
Eu te avisei que o mundo é ruim”,
Eu poderia ter dito isso, verdadeiro amigo,
Mas prefiro o silêncio submisso.

Nossa situação de miséria
Sustentada pela fé tão etérea;
Em oposição ao verdadeiro amor
Que trazes em crenças sinceras,
Está a fome e a dor que aperta
Quanto mais rezas e esperas;
Deus e Cristo, o ouro e a prata
São tesouros de lata
No sofrimento que de ti não aparta.

Então falar pra quê
Se não sei o que dizer
Apenas te deixo crer
Mesmo sem te entender.

É feito de vinil
Esse sentimento vazio
Que me cala sorrindo,
Quando me falas do fim,
Quando me dizes feliz:
Cante para viver o sim”;
Ah, verdadeiro amigo,
Melhor eu calado e contigo,
Minha voz é uma negação,
Não faço coro a tua religião;
Pra te evitar os meus labirintos,
Te deixo falando sozinho...

Nossas vidas são lembranças antigas
Em nossas respirações falidas
E a cada minuto que passa
O sopro do vento ultrapassa
Nossas despensas vazias...
Enquanto forjas um dia de alegria
Retomando flashes da Bíblia
Que só tua cegueira vivencia.
O meu medo se realiza:
Beija-nos a morte com sua boca macia;
A vida é coisa pouca
Que cada vez mais se distancia
Ah, mas a tua crença em Deus Pai
É tão forte, tão rica, tão bonita
Que minha pobreza se comove, se esvai,
Ao teu lado, até a morte é bem-vinda.

Então falar pra quê
Se não sei o que dizer
Apenas te deixo crer
Mesmo sem te entender.

Perdeu você”, tu me dirias
Se soubesses que não rezei na tua sintonia...
Enquanto a fome balança o lábaro estrelado
Com a fúria de um pássaro assassino,
Mesmo órfão e sem destino, tu acreditas
Na Pátria Amada, no Deus apático,
Que, onipresentes, veem nossa triste sina.
A minha vida eu entreguei”, tu repetirias
Mesmo se visses a morte que se aproxima.
E, mesmo no fim de nossa história,
Tu ainda acreditas em dias de glórias
Enquanto vejo a noite derradeira,
Esse tal amor de brincadeira
Com a tua apaixonada cegueira.
E, mesmo assim, eu nada falo;
Mesmo perdido, permaneço contigo,
Mesmo calado, permaneço ao teu lado.

Tá tudo lindo”, tu me dirias sorrindo,
Mas o som em tua voz já não tem nenhum abrigo;
Estamos indo, amigo, estamos indo...
Teus olhos suplicam pela sobrenatural eternidade,
Enquanto os meus refletem a natural transitoriedade;
Diga adeus à vida de compositor, amigo sonhador,
Porque o silêncio agora é o nosso único parceiro,
Isso eu poderia te dizer, mas somos companheiros;
Te vi passar em um pesadelo certeiro,
Eu poderia te falar, te provocar desassossego,
Mas prefiro me calar, eu prefiro o teu apreço,
Por isso, essa mudez, essa falta de jeito,
Não sou perfeito, mas não serei humano dessa vez,
Deixo-te com a ilusão que tanto crês;
Que os outros julguem com suas luzes de estupidez;
Permaneço negro, nego toda lucidez
E assim deixo-te feliz com tuas cruzes de insensatez.

Então falar pra quê
Se não sei o que dizer
Apenas te deixo crer
Mesmo sem te entender.

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